Com objetivo de conhecer os arquitetos, os projetos e as histórias por trás da arquitetura portuguesa de referência, Sara Nunes, da produtora de filmes de arquitetura Building Pictures, lançou o podcast No País dos Arquitectos, em que conversa com importantes nomes da arquitetura portuguesa contemporânea.
No episódio desta semana, Sara conversa com Nuno Brandão Costa sobre o projeto do Terminal Intermodal de Campanhã, no Porto. Reveja as outras entrevistas realizadas pelo podcast No Pais dos Arquitectos e leia a transcrição da entrevista com Costa, a seguir:
Entrevistas da série "No País dos Arquitectos":
Sara Nunes: Olá, Nuno, bem-vindo!
Nuno Brandão Costa: Olá, Sara!
SN: O arquitecto Nuno Brandão Costa nasceu no Porto, estudou no Porto e tem escritório no Porto. Que memórias guarda de Campanhã? Há memórias ligadas à estação e aos comboios?
NC: De facto, é curioso fazer-me esta pergunta porque existe uma memória bastante longínqua. Por exemplo, o meu avô paterno não vivia em Campanhã, vivia ali na zona da Boavista, mas tinha uma antiga fundição na zona de Campanhã que era uma herança do seu pai, que tinha uma joalharia. Lembro-me de ir muito miúdo a Campanhã a essa fundição, que se situava muito perto da estação. Ia de vez em quando para o meu avô e deslocava-me amiúde à fundição para ver o que se estava a fazer porque essa não era a sua profissão principal, pois ele era engenheiro agrónomo. Tenho, de facto, essa memória muito longínqua. Depois também quando entrei na Faculdade de Arquitectura, os dois primeiros anos foram na Escola de Belas Artes. A escola situa-se na zona mais oriental da cidade e também próxima de Campanhã. Depois finalmente, no último ano de curso, por coincidência, o nosso trabalho de fim de curso – que era um trabalho de grande escala de urbanismo com o professor Emanuel Fernandes de Sá e era um trabalho muito grande com uma área muito extensa – apanhava precisamente a zona onde estou agora a intervir.
SN: A sério?! (risos)
NC: Exactamente! E, portanto, há esta série de coincidências, embora eu sempre tenha vivido na zona ocidental da cidade e é onde continuo a viver atcualmente, mas existem estes momentos da minha vida que estão relacionados com Campanhã e tenho estas memórias.
SN: O Terminal Intermodal de Campanhã foi resultado de um concurso do qual o Nuno foi vencedor. Quais os desafios que o projecto colocava e os desafios que a localização colocava também a este projecto?
NC: Para além da resolução do programa que é o Terminal Intermodal, que convém informar trata-se de um espaço que tem de acomodar: um parque de estacionamento para viaturas ligeiras com cerca de 230 a 250 lugares; a zona das camionetas, que é a zona que tem mais impacto no programa e no projecto em termos de área e de funcionalidade; depois tinha todas as ligações que era importante garantir como os túneis do metro, as plataformas do caminho-de-ferro e outras ligações pedonais; e um parque para bicicletas. Ou seja, para além destas questões meramente funcionais também havia uma série de apoios à própria intermodal e pequenos espaços funcionais e de comércio. Desde o concurso que eu encarei sempre o projecto... Quer dizer, essa parte funcional tinha de estar solucionada. Essa é a parte óbvia do projecto. Quando nos dão o programa nós temos de resolver da forma mais funcional possível. No fundo, sempre encarei o projecto como uma oportunidade para resolver um pedaço considerável de território da parte oriental da cidade. Isto é, do lado nascente da linha de comboio, que estava expectante e que estava até de alguma maneira numa situação relativamente caótica. Aquilo tratava-se de uma faixa de terreno que se encontrava numa encruzilhada entre a linha do comboio, a via de cintura interna, que era uma auto-estrada (digamos), a saída dessas vias importantes e depois um tecido urbano que estava muito fragmentado, muito descaracterizado. Além disso, existe ali uma série de funções ainda importantes naquela zona, que não estavam de todo bem servidas. Ou seja, estavam servidas de forma precária. A certa altura a parte programática passou quase a ser secundária no sentido em que é óbvio que tinha de ser resolvida e está resolvida. O projecto, portanto, acaba por ser mais uma operação de renovação urbana e também, dada a dimensão do território que tínhamos para trabalhar, pareceu-me que era uma oportunidade de implantar naquela zona da cidade uma coisa que falta... ou talvez não falte, mas não está propriamente tratada e disseminada, que era e é um grande espaço verde. Dito por outras palavras, o grande protagonista do nosso projecto é um grande parque verde que se estende ao longo de toda a intervenção e que, na verdade, até se estende para lá da própria intervenção do terminal.
SN: O projecto ainda não está terminado, mas eu já tive oportunidade de ver imagens do projecto e também sempre que passo na VCI vou acompanhando o processo de obra. Uma das coisas que é bem visível nas imagens é que o parque tem um protagonismo enorme e quase dá a sensação de que o projecto é um parque e depois tem o terminal, mas o que é que nasceu primeiro aqui? Eu sei que o desafio era o concurso, mas a dada altura o parque tem um protagonismo muito grande neste projecto. Como é que as duas coisas se combinam, Nuno?
NC: A Sara fez a síntese perfeita agora nesta descrição que elaborou. O projecto é o parque, de facto. A essência do projecto, do ponto de vista urbano, é aquele grande parque que se estende em toda a zona da intervenção e até para lá da própria zona da intervenção propriamente dita porque aquela mancha verde ocupa todos os vazios que encontra como se fosse uma mancha de óleo, que vai expandir-se por todo o espaço que encontra. Ou seja, vai até o nó da Bonjóia, expande-se para nascente para uma zona que está também vazia e depois vai até o sul, junto à fábrica da Ceres. Esse grande parque é, de facto, a personagem principal. Quando digo “grande parque” não me refiro a um grande parque como o Parque da Cidade do Porto. Estamos a falar de um jardim que não é aquele jardim urbano típico, mas é um híbrido entre o parque e esse jardim urbano. Portanto, não tem a escala do Parque da Cidade, mas também não tem aquela dimensão dos jardins típicos do centro urbano.
SN: Estamos a falar de quatro hectares e meio, não é?
NC: Sim. Quer dizer, a intevenção tem 50 mil m2, o terminal propriamente dito, a construção civil tem cerca de 20 mil m2 e essa tal área vegetal tem aproximadamente 30 mil m2. Portanto, é um tamanho considerável.
SN: Estava a falar sobre esta fusão. Como é que se fundem estes dois espaços onde, por um lado, temos o jardim e por outro lado o terminal? Eu associo sempre o jardim a um lugar de calma e de silêncio e, por outro lado, existe o terminal em que chegam os automóveis, as bicicletas, os autocarros. Ou seja, por um lado temos o silêncio e a calma, por outro lado o movimento, não é?
NC: Sim, isso é uma questão importante e foi uma questão importante na própria concepção do projecto. Tenta-se resolver isso de uma forma relativamente simples com a seguinte estratégia: no fundo, o projecto propõe... Há uma coisa que é importante referir mesmo para leigos nesta matéria que é... O terreno tem um desnível muito considerável. Se imaginarmos uma linha de corte entre a cota ou o nível do caminho-de-ferro e a cota cá de baixo do nó da Bonjóia que é o ponto de onde se sai da VCI temos um desnível muito considerável, que é superior a 10 metros. Não sei neste momento dizer se são 11, ou 12 metros, mas sei que é superior a 10 metros, embora não pareça para quem anda lá... Foi neste desnível que encontramos a solução para a questão que está a colocar, que é: Como é que conseguimos casar estas duas atmosferas muito diferenciadas e como é que as colocamos a funcionar sem pôr em causa nenhuma delas?
Decidimos, portanto, colocar o terminal a funcionar em toda a cota baixa, ou seja à cota da saída da VCI e os arruamentos todos à cota mais inferior que encontramos; já a zona pedonal e ajardinada ficam na cota superior. Ou seja, está ao nível da estação do caminho-de-ferro. Evidentemente que isto depois não é exactamente assim porque o jardim é, em si mesmo, um talude. Ou seja, um plano inclinado que ao longo da extensão da intervenção vai ligando as duas cotas.
SN: Vai-se adaptando?
NC: Exacto, vai-se adaptando. É um talude e, portanto, foi essa a estratégia. As pessoas circulam à cota alta e o jardim expande-se sobretudo a partir da cota alta. Visualmente, a sua génese está muito a partir de cima e depois vai-se adaptando à topografia por ali abaixo, mas a parte mecânica nunca passa do lado de baixo e, de alguma maneira, nunca perturba o funcionamento mais lúdico e mais informal deste espaço ajardinado. Inclusive, há também aqui a questão atmosférica e do controlo do monóxido de carbono em que toda essa parte mecânica dos autocarros e dos carros fica cingida àquele plano inferior e a própria circulação como é feita é muito condicionada. Ou seja, eles entram por um lado, fazem um arco e saem virados para norte, mas tudo àquele nível inferior, ficando estacionados lá em baixo. E é esse o principal objectivo – os carros, as camionetas e as bicicletas entram (embora estas últimas não poluem)... mas todos esses veículos entram, estacionam e depois saem. Portanto, todo o movimento mais fluido, flexível e informal das pessoas é feito no nível superior. É quase como se fossem dois mundos, que se sobrepõem. E um mundo não impede o funcionamento do outro. É um pouco esta a perspectiva que se coloca.
SN: Eu tenho uma curiosidade. Quem é que decide o número de lugares de estacionamento, o número de paragens para autocarros e o número de lugares de táxi? Imagino que isto já vinha com o programa. Não sei se, entretanto, foram feitos estudos, se o arquitecto também faz essa investigação... Que tipo de estudos são feitos para averiguar o que a cidade precisa para que funcione?
NC: Tudo isso é uma coisa prévia ao concurso público. O próprio concurso foi elaborado em função desse programa. Ou seja, quando foi lançado o Concurso Público de Arquitectura e de Engenharia...
SN: Já havia esses números...
NC: Já havia esses números que foram elaborados com base em estudos, cálculos, dimensionamentos e por especialistas dessa área, que fizeram um programa, dimensionaram-no e o projecto cumpriu esses números.
SN: Em muitas cidades o carro está a ser abolido dos centros da cidade, como por exemplo na cidade de Milão, Madrid, ou Londres. Este projecto tem essa ambição de retirar os carros do centro e de dotar a cidade de uma melhor rede de transportes públicos?
NC: Embora não me caiba a mim essa decisão, eu penso que o próprio conceito de construir o Terminal Intermodal naquele sítio da cidade – que trata-se de uma saída ou entada da cidade (mediante o sentido em que as pessoas se deslocam)... no limite da cidade, junto à via férrea e à linha do metro – transporta essa decisão. Há ali uma ideia muito clara, por exemplo, relativamente às camionetas. Ou seja, os transportes que vêm de fora do Porto e vão para as cidades próximas do Porto que são muitas e onde se desloca muita gente... Existe a ideia de que essas camionetas, hoje em dia, estão a entrar pela cidade adentro, a perturbar o trânsito urbano, mas isso vai deixar de existir e não é pouco porque as camionetas ficam logo ali no terminal. Depois há um parque que dá para mais de 200 lugares de automóveis e que também implica que, por exemplo, quem vá apanhar o autocarro, o metro já não precisa de se meter pela cidade adentro com o automóvel e andar no trânsito. E depois são também sugeridas outras possibilidades de ligação com o próprio aeroporto, com os comboios etc... Há um protagonismo também da ciclovia, há um parque de estacionamento das bicicletas com cem lugares e, por outro lado, apela-se ao circuito pedonal.
O projecto tem essa faceta que é apelar muito a criar um circuito pedonal, até porque havia partes ali que estavam próximas, mas que não era possível serem ligadas pedonalmente que era a Quinta do Mitra, a zona da Ceres, a parte cá de baixo da nascente de Campanhã, a ligação para o matadouro.
E hoje em dia uma pessoa anda na cidade... até nestes tempos de pandemia se verifica... e quando digo “pessoas” refiro-me não só àquelas que são do Porto, mas do país todo... ainda assim as do Porto são as que eu conheço melhor e sei que cada vez têm mais esta vontade de andar a pé e de bicicleta. O projecto transporta essa ideia e cria uma série de percursos lineares e fluidos que eu acho que as pessoas vão aderir porque vão ter uma nova perspectiva e novas possibilidades de se deslocarem pedonalmente. Além disso, a própria ideia do parque (para além daquilo que eu já descrevi) também tem uma ideia de criar uma atmosfera despoluente. Ou seja, retira aquela carga de monóxido de carbono que chega ali e que se estaciona por baixo daquele complexo. Pode-se dizer que, sim, é um pequeno pulmão que se vai criar para ajudar a aliviar essa carga poluente. E também alivia a parte sonora com as próprias árvores.
SN: Também absorvem o som.
NC: Sim, também absorvem o som. Portanto, existem todas estas ideias que tentam confluir numa síntese o mais simples possível, até porque o projecto tenta ser muito simples dentro desta complexidade toda de lógicas díspares que temos de colocar em harmonia. Por outro lado, o projecto tem uma ideia muito simples de Arquitectura e de Urbanismo, pois trata-se de um edifício muito subtil que não tem grande aparência morfológica e volumétrica e depois ainda existe esse grande parque verde que vai ligar esses elementos. Pode-se dizer que é a cola desses elementos todos que estão ali dispersos hoje em dia.
SN: Para este projecto, quais foram as suas principais referências? Pergunto-lhe se visitou algum terminal de transportes para o ajudar a fazer este projecto. Fale-me sobre esse processo.
NC: Não visitei quando fiz o projecto, mas tinha na memória dois terminais que conheço relativamente bem. Um deles fica em Pamplona, na província de Navarra, em Espanha, e é um terminal que fica no nível abaixo do terreno, na cota do solo. É um terminal muito grande, mas não tem existência urbana. O outro terminal que eu conheço e que de alguma forma também me suscitou uma referência, embora seja muito diferente, mas ainda assim apresenta algumas questões, como o percurso urbano público e pedonal.
Falo, neste caso, do Terminal de Zurique. Mas se olharmos para estes terminais formalmente percebemos que nenhum deles tem a ver com o Terminal Intermodal de Campanhã.
SN: E nenhum deles é um parque, não é?
NC: Exacto. Nenhum deles é um parque. Por acaso o de Pamplona tem um parque de um dos lados.
SN: Ok.
NC: Mas é uma coisa diferente. E também por serem muito recentes havia uma certa ideia de contemporaneidade. Ou seja, uma coisa que é contemporânea e que foi feita há pouco tempo em princípio está actualizada. Depois havia uma referência – e que foi a minha referência principal para fazer este projecto, mas que não é um terminal, não tem nada a ver com um terminal... – que é um edifício público também, neste caso é uma piscina em Bellinzona, na Suíça, onde eu vivi durante uns tempos quando era mais novo e essa piscina era um local que visitava, de vez em quando. Essa piscina foi feita por um arquitecto suíço (do cantão italiano), que se chama Aurelio Galfetti e que acabou por me dar umas pistas. Resumindo, o arquitecto a propósito de fazer uma piscina (que no fundo é um tanque com água) criou um grande parque e fez um percurso pedonal linear para ligar partes da cidade que estavam ainda desconexas. Trata-se de uma zona com tecido urbano, caminho-de-ferro, com uma topografia acidentada. E quando vemos aquele projecto percebe-se que esta referência arquitectónica ao terminal é mais óbvia. Não é tanto a referência funcional porque são funções diferentes, mas digamos que Aurelio Galfetti encarou aquele programa de uma piscina para resolver uma série de coisas que considerou importantes resolver. Esse projecto da piscina é um projecto que se fez entre os anos 60 e 70 e, hoje em dia, aquilo funciona perfeitamente passados aproximadamente 50 anos. Foi uma referência muito forte nesta concepção do terminal intermodal.
SN: Tenho de espreitar!
NC: Há um princípio que é... O programa é um argumento e é um bom argumento. Penso que a Câmara Municipal do Porto decidiu bem qual o programa a encaixar naquele local, sem dúvida alguma. Foi uma decisão inteligente, mas para além de resolver o programa, o programa foi um argumento e uma oportunidade para resolver uma série de problemas expectantes, que estavam ali há décadas por definir.
SN: Como disse há pouco, eu passo muitas vezes pela VCI e nas várias vezes que passo por lá espreito para as obras do terminal e tenho a sensação que as obras avançaram relativamente rápido. Fale-nos dos desafios do processo construtivo que, entretanto, imagino que a inauguração esteja para breve. Fale-nos sobre o processo construtivo para percebermos quando vamos poder usar o terminal.
NC: A obra do terminal terminará no fim deste ano. Não sei exactamente a data, mas será no último trimestre de 2021, próximo do fim do ano, depois do Verão. A data é difícil de saber porque esta circunstância de pandemia está sempre a criar-nos surpresas porque a obra não pode ter tantos trabalhadores e isso diminui o ritmo. Mesmo assim com esta entropia toda da pandemia, a obra tem andado com um ritmo favorável e até relativamente rápida. A obra é muito desafiante de todos os pontos de vista. Há especialidades que têm ali um protagonismo enorme, nomeadamente a estrutura que foi muito solicitada e que eu felizmente estou muito bem acompanhado por todas as especialidades. A estrutura foi feita pelo gabinete do engenheiro Adão da Fonseca. É uma estrutura extraordinária. Eu acho que para um engenheiro civil é...
SN: É um trabalho fascinante!
NC: Tem uma complexidade e desafios impressionantes. Há ali uma contenção que foi feita à linha férrea, que é um muro de contenção e que tem os tais 12 metros de altura por cerca de 200 e tal metros de comprimento. Foi uma fase de obra incrível, uma coisa quase arqueológica de se fazer. É uma fase lenta da obra, complexa, que levanta imensos problemas, mas é uma obra de arte do ponto de vista da estrutura. A especialidade da hidráulica tem ali uma componente muito importante com a mobilidade de trânsito e todas as outras especialidades também, isto incluindo a própria Arquitectura evidentemente. É, de facto, uma obra fascinante! Para mim tem sido um processo incrível e eu penso que toda a gente que está envolvida na obra está muito motivada porque o processo é único e é diferente. É evidente que isto não é uma obra que se faz todos os dias. Isto não é propriamente um edifício, nem é uma casa, nem uma escola, nem uma biblioteca... É, sim, algo que atravessa várias especialidades, complexidades e muitas outras decisões que o projecto transporta e que têm de se tomar ao longo do processo. Dada a circunstância do próprio local, há uma série de infraestruturas e de preexistentes que tiveram de ser recolocadas, redimensionadas, alocadas ao projecto. Cada dia é uma aventura!
Quer dizer, agora já não tanto porque estamos numa fase em que entramos nos acabamentos, mas mesmo assim nos primeiros dois terços da obra aquilo, a cada dia, era uma aventura autêntica... Mas como estava a dizer, eu penso que toda as pessoas que estão envolvidas no processo têm entusiasmo com a obra do Terminal Intermodal de Campanhã. E quando digo “pessoas” refiro-me ao construtor, à fiscalização, ao dono de obra, nós, os projectistas e os operários que estão lá a trabalhar. Entro naquela obra e sinto que as pessoas estão motivadas. Aquilo é estimulante!
SN: Parece que as pessoas também estão entusiasmadas por saberem que estão a participar num projecto inovador e único para a cidade.
NC: Sim, tecnicamente é um projecto muito evoluído! Embora eu acho que, no fim, não se vai perceber isso. Aliás, pelo contrário porque é uma coisa simples e até quase subtil. Por outro lado, as pessoas que são da área, nomeadamente da área das estruturas vão perceber que por detrás daquilo tudo, por detrás da forma final, do resultado final, está ali um trabalho científico e técnico muito sofisticado.
SN: O que é que este terminal lhe ensinou sobre a Arquitectura?
NC: Muitas coisas! Isso dava um programa... Bem... eu penso que os arquitectos têm esta coisa que é... Estão em permanente aprendizagem! Aliás, penso que isso deve ser algo mais ou menos comum a qualquer profissão. Isto, claro, quando se faz a profissão com entusiasmo e com paixão. Evidentemente o arquitecto está em permanente aprendizagem, em permanente pesquisa. Fazer Arquitectura é um acto cultural e de investigação permanente. E, se calhar, num projecto com esta complexidade – com esta profusão de temas e com estas questões técnicas, urbanas, arquitectónicas e tantas outras – ainda se aprende mais. Embora eu não ache que seja pela escala do edifício que o projecto fica mais ou menos pior, ou é mais ou menos importante ou entusiasmante. Ainda assim, é evidente que este é um projecto diferente de todos os outros que eu fiz e não é só diferente pela questão da escala. É também esta oportunidade de mudar uma parte considerável do tecido urbano, de transformar a cidade naquele ponto e ter a noção de que essa transformação ali localizada vai de alguma forma expandir e alastrar-se para o resto da cidade, tendo consequências em muitas outras coisas como a mobilidade, a abordagem viária à cidade, a abordagem pedonal e a percepção das próprias possibilidades de ligação que vão passar a existir. É evidentemente um projecto muito especial.
SN: Obrigada, arquitecto Nuno por esta conversa. Estamos muito entusiasmados para em breve podermos também nós utilizar o Terminal Intermodal de Campanhã.
NC: Obrigado eu. Foi um prazer!
Nota do editor: A transcrição da entrevista foi disponibilizada por Sara Nunes e segue o antigo acordo ortográfico de Portugal.